martes, 25 de abril de 2017

"EU PENSEI QUE TODO MUNDO FOSSE FILHO DE PAPAI NOEL" - Assis Valente: um valente que não resistiu até o final...


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  BOAS FESTAS
(“Eu pensei que todo mundo fosse filho de Papai Noel”)

Anoiteceu, o sino gemeu
E a gente ficou feliz a rezar
Papai Noel, vê se você tem
A felicidade pra você me dar
Eu pensei que todo mundo
Fosse filho de Papai Noel
Bem assim, felicidade
Eu pensei que fosse uma
Brincadeira de papel
Já faz tempo que eu pedi
Mas o meu Papai Noel não vem
Com certeza já morreu
Ou então felicidade
É brinquedo que não tem



O autor de “Boas Festas”, célebre canção natalina presente em qualquer álbum natalino, o baiano Assis Valente, viveu uma vida marcada por altos e baixos com um fim mais do que trágico: endividamento, dependência química e suicídio.

Assis Valente teve uma infância bastante difícil quase dickensiana: era filho bastardo, foi roubado dos seus pais quando criança, trabalhando em regime de semi-escravidão obrigado pelos pais adotivos que o faziam trabalhar durante o dia e estudar à noite. Aprendeu a ser um grande declamador,  viveu de favor, trabalhou como declamador e comediante num circo... Até decidir-se mudar para o Rio de janeiro para tentar a sorte como protético ou desenhista.  Assis nunca esqueceu o fato de ter vivido uma infância assim o que teve repercussões em sua vida e obra também no futuro.

                “_Papai Noel, vê se você tem 
a felicidade pra você me dar…”


Com esse triste e melancólico verso o compositor Assis Valente demonstra já os primeiros traços da depressão que o acompanhou grande parte de sua vida. Depressão essa associada à dependência química (consumia cocaína), o teria conduzido à morte , por sua via mais obscura: o suicídio.






UM ARTISTA PROTÉTICO

Assis Valente ficou famoso por escrever sambas lá pelos idos dos anos 30 – considerada a “época de ouro” da música popular brasileira (MPB), muito antes da invenção da Bossa Nova. 

Protético de profissão, tinha um laboratório de próteses dentárias na Cinelândia, juntamente com um sócio e era assim que valentemente ganhava a vida. Inclusive era considerado um dos  melhores protéticos da cidade. Entretanto, o sócio, acabou com a parceria com Valente por conta da vida artística deste. De este modo, em 1938 abriu o seu próprio laboratório. 

Além do dom da música,Valente tinha um talento único para o desenho, fez cursos de desenho no Liceu de Artes e Ofício e depois de muito bater portas conseguiu publicar seus desenhos em periódicos como  Shimmy e na revista Fon-fon. 

Falando de sua vida amorosa, sabe-se que Assis nutria um amor platônico por Carmem Miranda, quem inclusive gravou muitas das suas músicas como “Camisa Listada”. Logo depois que Carmem se mudara para os EUA em 1941 a sua carreira artística foi  paulatinamente desvanecendo pouco a pouco, a pesar de que mesmo sob condições adversas, não parava de compor.


ASSIS E A "PEQUENA NOTÁVEL"


Compôs músicas especialmente para Carmem, ao todo foram 25 músicas na voz dela.  Assis se sentiu abandonado, por outro lado já era procurado por outros cantores que gostavam muito de suas músicas, Quando do regresso de Carmen Assis aproveitou a oportunidade para compor duas músicas especialmente para ela: “Recenseamento” e “Brasil Pandeiro”. Porém, Carmem só gravou  a primeira, e disse sobre a segunda:


  “-Assis, isso não presta. Você ficou borocoxô!” 

Essas palavras o magoaram profundamente pois tinha certeza de que era uma música de boa qualidade, inclusive  foi gravada posteriormente por outros cantores com sucesso absoluto. Para voz de Carmem compôs ainda: “Camisa Listada”, “Etc”, “Tão grande, tão bobo”, “Lulu”, “Sapateia no chão”, “Minha Embaixada chegou”, “Recadinho de Papai Noel”, “Por causa de você, Ioiô”


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MATRIMÔNIO E TENTATIVAS DE SUICÍDIO

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 Ainda no auge de sua carreira artística casou-se com Nadili (de quem separou-se pouco depois), com quem teve uma única filha: Nara Nadili . Neste mesmo ano, tentou suicídio jogando-se do alto do morro do Corcovado, mas, felizmente e por milagre ficou preso nos galhos de árvores que amorteceram a sua queda, evitando assim a sua morte. Logo em seguida, foi resgatado pelo corpo de bombeiros.

Passado algum tempo, tentou novamente suicídio  cortando os punhos com lâminas de barbear, devido ao fato de que Elvira Pagã cobra-lhe de maneira escandalosa um dívida. Desde então passou a viver das rendas que lhe ofereciam as próteses e para pagar o laboratório era obrigado a contrair mais dívidas. Mas, contudo e tudo, continuava compondo e mostrava com frequência suas novas composições aos amigos íntimos.

Outro fato agravava a situação de Valente: o declínio do samba tradicional na década de 50. Assim, suas músicas foram pouco a pouco deixando de ser gravadas até Assis cair no mais profundo esquecimento. Ao mesmo tempo é a época que surge a Bossa Nova e que ia se estabelecendo como representante da MPB (Música Popular Brasileira) no Brasil e no exterior.

Esquecimento, declínio de sua carreira e de seu estilo musical, endividamento, dependência química já eram motivos suficientes que justificavam sua depressão progressiva que o levaria a mais uma tentativa de suicídio.

Alguns dizem que tentou suicídio por 3 vezes, outros que em total foram 6. O fato é que a última e eficaz tentativa de suicídio foi dia 10 de março de 1958, novamente devido à sua situação financeira. Tomou veneno para ratos misturado com guaraná sentado em um banco de um play-ground onde brincavam as crianças. Em sua carta suicida ainda fazia um apelo para que o público comprasse o seu último lançamento “Lamento”. Pedia ao então também compositor Ary Barroso, seu amigo, que pagasse o aluguel atrasado de duas residências. E assim termina sua carta: “Vou parar de escrever, pois estou chorando de saudades de todos e de tudo”, dando fim, assim a uma carreira brilhante e profícua.


REPERCUSSÃO DA OBRA DESTE GENIAL COMPOSITOR BRASILEIRO

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A biografia do compositor de uma das mais célebres canções natalinas brasileiras é de emocionar e já foi tema até de um livro escrito pelo jornalista baiano Gonçalo Junior (“Quem tem samba tem alegria”).  Sua biografia tem ingredientes suficientes para um filme de sucesso, pois sua vida foi muito sofrida, penosa, dramática e cheia de altos e baixos, sempre na corda bamba: uma verdadeira “vida de artista” apesar de nunca ter-se dedicado à carreira artística de forma integral conjugando-a com a profissão de protético. 


Chegou a compor uma música por dia e muitas delas vendidas a preços irrisórios, quando as dívidas apertavam.  Também é autor de “Cai, cai, balão”, gravada por Aurora Miranda, irmã de Carmem Miranda, juntamente com Francisco Alves e hoje é considerada patrimônio musical infantil brasileiro. Não só compôs músicas também foi autor de  peças para o Teatro de revista, como “Rei Momo na Guerra” de 1943. “Boas Festas” sua composição mais conhecida e cantada até hoje é presença obrigatória de qualquer coletânea brasileira de canções natalinas e inclusive é interpretada por orquestras  em todo o mundo como o Grupo Orquestra ciudad de Granada com um grande coral infantil, crianças espanholas cantam em português com um leve sotaque e até coreografam a canção. 

O que diria Valente se estivesse vivo ao ver a grande repercussão de seu trabalho por todo o mundo hoje? Certamente que não se suicidaria. Pelo menos, para seu consolo, ele ainda continua vivo em cada festa natalina brasileira ao ouvirmos soar sua composição mais conhecida: “Boas Festas” (também conhecida como "Anoiteceu" ou "Eu pensei que todo mundo fosse filho de Papai Noel"). Isso mesmo, "anoiteceu, o sino gemeu..." e desta vez gemeu muito, muito alto, como um lamúrio, um lamento mesmo pela morte de um dos grandes compositores brasileiros do século XX.



"Assis Valente, para mim é um dos gênios da música popular, e de fato era. Um homem que inaugurou assim o que começou o ciclo da crônica pós-carnavalesca, com citações do carnaval que passou."
(Dorival Caymmi)

*    *    *

Assim como Assis Valente, muitos talentos e compositores brasileiros caíram no esquecimento que hoje em dia ninguém nem sabe quem são, por um motivo ou outro suas histórias não chegaram ao grande público.



DOCUMENTÁRIO SOBRE A VIDA DE ASSIS VALENTE
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